sexta-feira, 28 de maio de 2010

Máscara

É incrível o que fantasias e algumas máscaras podem causar às pessoas. Depois de ontem, me parece que num baile à fantasia deixamos que um lado nosso, que muitas vezes mantemos escondido, se liberte, saia a tona e dance até o amanhecer.

Certa vez um caro amigo disse-me que quando nos fantasiamos escolhemos nos vestir de acordo com nossos desejos sexuais, pois essa é uma das poucas oportunidades que temos de expô-los em público sem chamar demasiada atenção,pois afinal, todos estão fazendo o mesmo. Se essa teoria se mostrar verdadeira, entenderei o excesso de rabos e chifres, e a ausência de panos nas roupas mesmo em uma noite muito fria.

Pernas de fora, decotes abusados, saias que nada tampam, espartilhos vermelhos (ou verdes) que chamam toda a atenção, músculos forçados à mostra, compõem a paisagem de uma festa na qual nada é proibido. Você pode ser um menino que se transforma em menina, você pode ser uma abusada dançarina Moulin Rouge com todas as penas coloridas que seduzem qualquer homem; você ainda pode ser um ursinho carinhoso carente por um abraço, ou uma gueixa, que, por trás de toda discrição pode esconder coisas inimagináveis.

Eu, por minha vez escolhi vestir uma máscara, e nada mais especial. Deixei de lado as fantasias grandes e engraçadas, ou as bonitas e clássicas, e mesmo aquelas que sempre podemos criar em casa. Não, nada disso parecia se adequar ao que eu realmente queria, até porque eu ainda não sabia o que queria. Então, o que poderia ser melhor que uma tradicional e sugestiva máscara?

Claro que não era difícil me reconhecer, e aqueles que diariamente convivem comigo não exitavam em dizer meu nome logo na primeira vez em que me viam. E hoje, recordando todos os encontros e desencontros da noite de ontem, todas as insinuações, tenho a impressão de que minha singela máscara tornou-se símbolo de algo que eu ainda não sei definir o que.

Desde minha infância as pessoas me contam muitas coisas, não sei o motivo de toda essa confiança, mas se é assim, que assim seja então. E ontem, parece-me que ao me olharem muitos não resistiram ao impulso de logo me contar algo ou demonstrar algo.

Devo dizer que muito ouvi, de muito ri, e por vezes me encontrei boquiaberto com os acontecimentos. E tenho a impressão de que tornei-me esse depósito de segredos devido ao poder da máscara. Claro que ela não é um objeto mágico, porém isso não quer dizer que o objeto não possa fazer nenhuma mágica

Quem sabe ao me olharem e verem apenas parte de mim essas pessoas tenham pensando que eu não era realmente eu ali, mas apenas um pouco do todo, e que, ao tirar a máscara, o passado, o contado e compartilhado iria ser esquecido, iria ser guardado até o próximo baile.

Pois afinal, na nossa cultura as máscaras sempre representaram muito, e, na minha opinião, elas representam mistério acima de todas as coisas. Elas podem representar novas possibilidades, novas descobertas, novas realidades, pois mascarado, não se é facilmente reconhecido, então pode-se muito bem fazer aquilo que se deseja mas que não pode ser feito.

E devo dizer que não esperava descobrir tantas possibilidades e novas realidades, o que não quer dizer que não tenha gostado de descobrir tanto. Algumas descobertas simples, contadas ao pé do ouvido, outras não sendo realmente contadas, mas demonstradas com enlaçamento de mãos que ainda não sei onde poderia me levar, outra ainda, e essa foi minha descoberta predileta, foi dita não com palavras, mas sim causando-me arrepios que ainda posso sentir, mesmo depois de tantas horas.

E agora, no dia seguinte, creio que todos tenham acordado como eu, sentindo como se tivessem vivido um sonho belíssimo no qual dançávamos uma dança de mistérios, onde ser o que se é convencionalmente é o não convencional, uma misteriosa noite de mascarados, que desejávamos não ter fim. Porém ela teve, e por vezes fui desperto com mensagens no meu celular, todas dizendo a mesma coisa: "Guarde o nosso segredo."

Sim meus caros, os guardarei com muito prazer e divertimento, porém jamais os esquecerei. Especialmente alguns que particularmente me agradaram, particularmente aquele que ainda me arrepia os pêlos da nuca, aquele que me fez ansiar pela próxima noite de fantasias, pois nada foi melhor do que ser a máscara que outros queriam colocar.

Um comentário:

  1. Muito bom. Eu vive um baile de máscara. Você me fez lembrar de um conto de Edgar Allan Poe chamado A Máscara da Morte Rubra, já leu? Se não leu eu mega indico. Tenho certeza que você vai adorar.

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